Projeto de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação Universitária de Ciências da Saúde / Escola de Ciências Médicas de Alagoas, sob o parecer/cadastro número 1.482.327, registrado no SISNEP sob o número 51052915.5.0000.5011, contemplado pela bolsa de pesquisa da instituição/programa CNPq/PIBIC. As autoras informam a inexistência de conflito de interesse na realização desta pesquisa.
PROFILE OF DEATHS ARISING FROM TRAFFIC ACCIDENTS CATALOGUED IN THE IML OF MACEIÓ, BETWEEN 2011 AND 2015
Jessyca Montenegro Matthews de Lyra (1)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6056775132290148
Alzeane de Araújo Lucena (1)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/0784862128954246
Maria Luísa Duarte (1)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1797072187529809 – ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9030-2720
(1) Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas, Maceió-AL, Brasil. (Autor Principal).
E-mail: anelucena1@gmail.com
RESUMO
Os acidentes de transporte terrestre configuram-se como um problema de saúde pública, pois dizimam indivíduos economicamente ativos, desestruturam famílias e trazem altos custos ao Brasil. O objetivo deste estudo foi determinar o perfil epidemiológico das vítimas fatais de acidentes de trânsito em Alagoas no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2015. O estudo foi observacional, descritivo e analítico e as informações foram colhidas nos registros de entrada de cadáveres do arquivo do Instituto Médico Legal Estácio de Lima de Maceió, no período descrito. Das 1.917 fichas cadavéricas analisadas, o predomínio (83%) foi do gênero masculino, na faixa etária de 20 a 29 anos. No universo pesquisado, predominaram as vítimas que não possuíam curso superior declarado (85%). Os óbitos ocorridos com maior frequência foram de solteiros (58%) e pardos (74%). Preponderaram acidentes fatais em rodovias municipais (46%), destacando-se as ocorrências de sexta a domingo (54%), entre 18h01min a 00h00min (39%). Motocicletas (47%) e automóveis (26%) foram os meios de transporte prevalentes e o principal tipo de acidente foi a colisão (42%). Nas vias públicas verificaram-se mais óbitos (54%), estando Maceió no topo dos sinistros (34,8%). Já a principal causa da morte foi o politraumatismo (30%). Os resultados encontrados são semelhantes aos de outras pesquisas efetuadas em nosso país com o mesmo objetivo. Este estudo contrapõe-se à precariedade de fontes sobre este tema no estado de Alagoas, e torna possível que esses dados possam no futuro ser empregados em políticas governamentais que tragam melhorias para a população.
Palavras-chave: acidentes de trânsito, acidentes de transporte, mortalidade, medicina legal.
ABSTRACT
Land traffic accidents are a public health problem, since they decimate economically active individuals, disorganize families and bring high costs to Brazil. The objective of this study is to determine the epidemiological profile of the fatal victims of traffic accidents in Alagoas from January 2011 to December 2015. The study was observational, descriptive and analytical and the information was collected in the records of cadavers from the archive of the Legal Medical Institute Estácio de Lima from Maceió, during the period described. Of the 1.917 cadaveric records analyzed, 83% were male, in the 20-29 age range. In the universe surveyed, victims with no higher education were a majority (85%). The most frequent deaths were of unmarried individuals (58%) and of brown complexion (74%). Prevalence of fatal accidents happened on municipal highways (46%), highlighting occurrences from Friday to Sunday (54%), from 18:01 to 00:00 (39%). Motorcycles (47%) and automobiles (26%) were the main means of transportation and the main type of accident was collision (42%). On the public roads, there were more deaths (54%), with Maceió at the top of the claims (34.8%). The main cause of death was polytrauma (30%). The results are similar to those of other surveys carried out in our country with the same objective. This study goes against the precariousness of sources on this subject in the state of Alagoas, and enables this data to be used in government policies that bring improvements to the population in the future.
Keywords: accidents of transit, accidents of transport, mortality, legal medicine.
1.INTRODUÇÃO
A morbimortalidade por acidente de transporte terrestre no Brasil é um fenômeno extremamente complexo e de elevada magnitude. Na verdade, é reflexo negativo em um país com investimento tardio em segurança viária, em contraponto a uma vigorosa política de incentivo à instalação de novos parques automobilísticos, e sem estabelecimento de educação para o trânsito nos níveis educacionais básicos (1). Nas duas últimas décadas do século XX, os acidentes de trânsito passaram a ser considerados um problema de saúde pública, devido aos dispêndios que deles decorrem. Vale classificar estes custos em: despesas médico-hospitalares, implicação em processos judiciais, congestionamento, custo previdenciário, danos ao mobiliário urbano e à propriedade de terceiros, dentre outros (2). Todo este cenário, para ser modificado, deve ganhar o alcance da mídia e a opinião pública, e para isso deve-se investigar cientificamente as causas, efeitos, conseqüências e soluções para minimização e controle dos impactos decorrentes de tais acidentes (3).
Há uma relação muito íntima entre acidentes de trânsito e consumo de bebidas alcoólicas (4), apesar da instituição de mecanismos inibidores contidos na denominada “Lei Seca” (Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, modificada pelas Leis nºs 11.705, de 19 de junho de 2008 e 12.760, de 20 de dezembro de 2012) (5). O álcool, além de alterar a capacidade visual do indivíduo, aumenta as chances de o mesmo dirigir acima do limite de velocidade, sem a percepção do dano que pode causar com seu baixo reflexo motor (5), o que pode ocasionar a elevação do número de acidentes e a gravidade destes.
Em relação às vítimas desses acidentes, desde 2010, os motociclistas ocupam o primeiro lugar de risco em óbito. Contudo, os ocupantes de veículos automotores também apresentam tendência crescente de morte (6). Outro grupo bastante vulnerável é o dos ciclistas, que principalmente nas regiões metropolitanas apresentam-se expostos pela proximidade nas vias condutoras, sem sinalização adequada (1), e tão pouco sem faixas exclusivas em favor dos mesmos (7).
Tudo isso demonstra a necessidade de se identificarem grupos vulneráveis, além de fatores de risco para que possam ser elaboradas políticas públicas baseadas em evidências (8).
A proposta para a execução desse projeto despontou a partir das evidências descritas, que nos certifica da gravidade desse problema, assim como da carência, no estado de Alagoas, de estudos que detalhem informações importantes como o perfil epidemiológico dos indivíduos que vão a óbito devido a essa causa externa, dificultando assim a criação de medidas que visem intervir em áreas prioritárias.
A pesquisa é descritiva e analítica, pois visa determinar as características de um grupo específico, assim como identificar fatores que possam contribuir para sua ocorrência. Também é documental, já que o material utilizado não sofrera tratamento analítico prévio (9) e possui natureza observacional, tendo em vista que não interferimos no curso natural dos fatos (10).
2. MATERIAL E MÉTODO
As informações foram obtidas mediante exame das fichas cadavéricas arquivadas no Instituto Médico Legal Estácio de Lima de Maceió-Alagoas, durante cinco anos, compreendendo o período de janeiro de 2011 a dezembro de 2015. A escolha do método foi fundamentada em outros estudos (11,12) que possuíam objetos semelhantes aos deste. Os dados foram colhidos por meio de um protocolo elaborado para tal finalidade, o qual possuía questões fechadas e abertas. As fichas cadavéricas contendo número insuficiente de informações foram excluídas.
As variáveis analisadas foram: gênero, idade, estado civil, nível de escolaridade, raça/cor, tipo de veículo, local de ocorrência do acidente, tipo de acidente, local de ocorrência do óbito, dia da semana, horário, município de ocorrência do acidente e causas de morte.
Analisando os dados catalogados, a amostra foi definida. Os resultados serão apresentados descritivamente, por intermédio de tabelas elaboradas no editor de texto Word, com gráficos produzidos pelo Software Origin 8.0.
As autoras informam a inexistência de conflito de interesse na realização desta pesquisa.
3. RESULTADOS
Foram analisadas 1.917 fichas cadavéricas dos arquivos do IML, preenchidas entre o período de 01/01/2011 a 31/12/2015, cada qual correspondendo a uma vítima fatal de acidente de trânsito, sendo 1.604 do gênero masculino (83,6%) e 313 do gênero feminino (16,4%). Do quinquênio sob análise, a idade das vítimas fatais predominante compreende as da faixa etária entre 20 e 39 anos (47,22%).
Do universo pesquisado, imperaram as vítimas sem curso superior declarado (74,76%). Os óbitos com maior freqüência foram observados em indivíduos solteiros (54,05%) e pardos (67,14%) (Tabela 1).
Características da vítima | Masculino | Feminino | Total |
n % | n % | n % | |
Faixa etária | 1604 | 313 | 1917 |
0-10 | 26 1,62 | 18 5,75 | 44 2,29 |
11-19 | 129 8,04 | 33 10,54 | 162 8,45 |
20-39 | 783 48,82 | 122 38,98 | 905 47,22 |
40-59 | 483 30,12 | 85 27,16 | 568 29,64 |
60 ou mais | 157 9,78 | 50 15,98 | 207 10,79 |
Sem informação | 26 1,62 | 5 1,59 | 31 1,61 |
Estado civil | |||
Solteiro | 874 54,48 | 162 51,77 | 1036 54,05 |
Casado | 547 34,12 | 98 31,32 | 645 33,65 |
Viúvo | 30 1,87 | 27 8,62 | 57 2,97 |
Divorciado | 24 1,49 | 6 1,91 | 30 1,56 |
Não informado | 129 8,04 | 20 6,38 | 149 7,77 |
Nível de escolaridade | |||
Com nível superior declarado | 24 1,49 | 18 5,75 | 42 2,19 |
Sem nível superior declarado | 1217 75,89 | 216 69,03 | 1433 74,76 |
Aposentado | 96 5,98 | 29 9,26 | 125 6,52 |
Desempregado | 44 2,74 | 4 1,27 | 48 2,50 |
Não informado | 223 13,90 | 46 14,69 | 269 14,03 |
Cor/Raça | |||
Branca | 273 17,03 | 76 24,29 | 349 18,21 |
Preta | 80 4,98 | 5 1,59 | 85 4,43 |
Parda | 1097 68,39 | 190 60,71 | 1287 67,14 |
Indígena | – | – | – |
Amarela | – | – | – |
Não informado | 154 9,60 | 42 13,41 | 196 10,22 |
Tabela 1. Características sociodemográficas das vítimas fatais envolvidas em acidentes de trânsito catalogadas nas fichas cadavéricas no período de 2011-2015 no IML Estácio de Lima, Maceió/AL.
De acordo com o Gráfico 1, o ano de 2014 apresentou o maior número de infortúnios fatais, com 408 óbitos, seguido dos anos de 2011 e 2012, cada qual com 407 óbitos. Os menores registros ocorreram em 2013 e 2015, com 398 e 297 óbitos, respectivamente.
Com relação ao local do acidente, as vias municipais (incluindo as estradas vicinais), respondem por 31,2% das mortes, ou 599 vítimas fatais. As rodovias federais representam 21,5%, com 414 óbitos, e nas vias sob jurisdição estadual foram identificados 243 óbitos, representando 12,7% do universo pesquisado. Maceió, com 668 óbitos declarados (34,84%), seguida de Coruripe, com 94 óbitos (4,90%), São Miguel dos Campos, com 92 óbitos (4,80%), e Rio Largo, com 81 óbitos (4,22%), estão no topo da lista dos acidentes fatais (Tabela 2).
Municípios | Número de vítimas | % |
Maceió
Coruripe São Miguel dos Campos Rio Largo União dos Palmares | 668
94 92 81 79 | 34,84
4,90 4,80 4,22 4,12 |
Pilar | 75 | 3,92 |
Marechal Deodoro | 74 | 3,86 |
Atalaia | 54 | 2,82 |
Messias | 53 | 2,76 |
Joaquim Gomes | 46 | 2,40 |
São José da Laje | 38 | 1,98 |
Maragogi | 36 | 1,88 |
Murici | 34 | 1,77 |
Novo Lino | 31 | 1,62 |
Outros | 439 | 22,91 |
Não informado | 23 | 1,20 |
Tabela 2. Ocorrência de acidentes de transito prevalecentes por município entre o período de 2011- 2015 no IML Estácio de Lima, Maceió/AL.
Motocicletas (26,76%) e automóveis de passeio (14,92%) estão à frente dentre os meios de transportes envolvidos nas mortes, sendo hegemônicos os tipos de acidentes por atropelamento (25,4%) e por colisão (26,71%). Foram catalogadas 1034 mortes no próprio local do acidente (53,94%), e 762 mortes diagnosticadas em estabelecimentos de saúde (39,75%).
A causa mortis foi resultante, em sua maioria, de politraumatismo (30,26%) e de Traumatismo Crânio Encefálico – TCE (26,6%). (Tabela 3).
Variáveis | N | % |
Causa mortis | ||
Politraumatismo | 580 | 30,26 |
TCE | 510 | 26,60 |
Hemorragia aguda | 135 | 7,04 |
Choque neurogênico | 77 | 4,02 |
Lesão do tecido cerebral | 157 | 8,19 |
Outros | 448 | 23,37 |
Não informado | 10 | 0,52 |
Tipo do veículo | ||
Motocicleta | 513 | 26,76 |
Automóvel | 286 | 14,92 |
Pedestre | 206 | 10,75 |
Bicicleta | 46 | 2,40 |
Caminhão | 14 | 0,73 |
Trator | 7 | 0,36 |
Outros | 8 | 0,42 |
Não informado | 837 | 43,66 |
Local de ocorrência do óbito | ||
Via pública | 1034 | 53,94 |
Em trânsito | 91 | 4,75 |
Hospital | 762 | 39,75 |
Residência | 9 | 0,47 |
Não informado | 21 | 1,09 |
Local de ocorrência do acidente | ||
Via Federal | 414 | 21,60 |
Via Estadual | 245 | 12,78 |
Via Municipal | 582 | 30,36 |
Via vicinal | 17 | 0,89 |
Não informação | 659 | 34,37 |
Tipo de acidente | ||
Colisão | 512 | 26,71 |
Atropelamento | 487 | 25,40 |
Capotamento | 94 | 4,90 |
Queda | 114 | 5,95 |
Não informado | 710 | 37,04 |
Dia da semana do acidente | ||
Segunda-quinta | 851 | 44,39 |
Sexta-domingo | 1033 | 53,89 |
Não informado | 33 |
1,72 |
Tabela 3. Causa mortis predominantes e outros dados relacionados aos óbitos provocados por acidentes de transito catalogados entre 2011- 2015 no IML Estácio de Lima, Maceió/AL.
Demonstra-se no Gráfico 2 que os acidentes no período noturno, entre 18:01h e 00h (32,9%), são os mais recorrentes em Maceió e adjacências.
4. DISCUSSÃO
Ponderando acerca da mortalidade decorrente de acidentes de transporte terrestre, devemos considerar três fatores que estão em inter-relação: as características das vias, dos indivíduos e dos tipos de veículos envolvidos (1). No desenvolvimento da pesquisa, são analisadas essas variáveis, tendo consciência da complexidade de fatores que se relacionam a esse agravo e das conseqüências que tais óbitos trazem para o crescimento socioeconômico do país.
A análise dos resultados revela a prevalência de vítimas fatais entre os homens (83%), concentradas, sobretudo na faixa etária entre 20-39 anos (47,2%). Esses dados coincidem com resultados obtidos em outros estudos nacionais (13,14,15) e também com a pesquisa feita pela Organização Mundial da Saúde, em que foi detectado que 2/3 dos óbitos por acidentes de trânsito no mundo acometem homens adultos jovens (16). Esse achado pode ser justificado pelo fato de que os mesmos se expõem com maior freqüência a fatores de risco, como conduzir em velocidade acima do limite permitido na via, ingerir bebidas alcoólicas e não utilizar cinto de segurança.
A maioria dos óbitos ocorreu em pessoas que não declararam possuir nível superior de escolaridade, solteiros e pardos. Montenegro et al (17), em estudo dos acidentes de trânsito no Distrito Federal entre os anos de 1996 e 2007, também encontrou prevalência de pardos (71%), com baixa escolaridade – entre 4 e 11 anos de freqüência escolar (54,8%), e solteiros (68,1%), em óbitos entre motociclistas. Em tese, os solteiros predominam por apresentarem atitudes mais desafiadoras no trânsito. A cor parda e a ausência do nível superior completo coincidem com o tipo mediano da população alagoana, como mostra o último censo do DATASUS de 2010, em que 53,5% dos jovens são pardos e com o 2º ciclo fundamental completo ou mais (18).
Os acidentes entre a sexta-feira e o domingo (53,8%) sobrelevam-se em comparação aos demais dias da semana, com mortes ocorrendo substantivamente nos fins de semana devido, em princípio, à ingestão de bebidas alcoolicas, a ultrapassagens mais arriscadas e à diminuição da fiscalização de trânsito, resultado com alto grau de equivalência detectado nas pesquisas realizadas em Sergipe (19) e no Piauí (20). Além disso, nesses dias, o trânsito está menos intenso, sem congestionamento, o que permite velocidades mais elevadas (1).
Os registros de óbitos ocorridos nas vias públicas, principalmente no próprio local do acidente (53,9%), predominaram nesse estudo, presumivelmente em decorrência da cinemática do acidente, pela relação velocidade x gravidade de lesões. Também se deve ressaltar a relevância do atendimento pré-hospitalar ofertado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) (21), o qual, sem dúvida, contribuiu na redução da morbimortalidade da população alagoana.
Com relação ao horário, a primeira parte do período noturno, compreendida entre 18:01h a 00:00h (32,9%) sobressaiu-se em relação aos demais segmentos observados, sugerindo uma correlação entre menor fluxo de carros, diminuição da visibilidade nas estradas e má sinalização horizontal (1, 22). É provável que haja relação com o cansaço ao final do dia e ser o período no qual ocorre maior ingestão de bebida alcoólica (17).
Encontramos a maioria dos sinistros ocorrendo em vias municipais (30,3%), o que difere de estudos como de Fey et al (22), no qual as rodovias federais foram o principal local dos eventos (22,8%). No entanto, vale realçar que 34,3%, ou seja, 659 laudos periciais não continham tal informação, inviabilizando dispor de informações de universo amostral mais amplo, e assim aproximar-se da realidade de Maceió e seu entorno. Dos municípios examinados, a capital alagoana foi a cidade com maior registro dessa causa de morte externa, por ter um significativo número de veículos licenciados, da ocorrência constante de fluxo diário de veículos perfazendo o trajeto Maceió – cidades “dormitório” – Maceió, corroborado, nesse caso, por ter uma extensa malha rodoviária composta com as principais vias expressas do Estado, como as rodovias AL 101, BR 104 e BR 316 (23).
A motocicleta foi o principal tipo de veículo envolvido na morte de seus ocupantes (26,7%), considerando os laudos cadavéricos com informações detalhadas do(s) veículo(s) envolvido(s), tendo relação de identidade com o de outros estudos (14, 15, 21). A vulnerabilidade e a imprudência de seus condutores, combinada com aumento na venda deste meio de transporte, mais econômico e, portanto, com preços acessíveis à população de baixa renda, vem elevando os índices de mortes violentas no trânsito em nosso País, e também no Estado de Alagoas. Frise-se que boa parcela dos motociclistas utiliza este meio de transporte de forma profissional, estando seu serviço atrelado à produtividade e necessitando assim dirigir com maior rapidez (17).
A natureza do acidente que mais apareceu no levantamento dos dados foi a colisão (27,7%), dado que se assemelha ao que foi deparado na pesquisa de Almeida et al. (1), neste caso com alta incidência (78,1%). É importante referir que 710 laudos (37,03%) não continham esse dado, prejudicando na elaboração e aplicação de medidas preventivas direcionadas para controle deste sinistro.
A principal causa mortis foi o politraumatismo (30,2%), seguida pelo Traumatismo Crânio Encefálico – TCE (26,6%), com similitude, portanto, àquele revelado por Paixão et al (8).
As informações colhidas das fichas cadavéricas carecem de dados, em razão do preenchimento incompleto dos campos dos formulários arquivados no IML, o que limitou a qualificação desejada no estudo, sobretudo o tipo de veículo, o local de ocorrência do acidente e o tipo de acidente. Assim sendo, é meritória a qualificação dos agentes públicos para registrar a descrição discriminada dos dados exigidos no formulário, no que auxiliaria o conhecimento científico da dinâmica dos acidentes e, assim, permitiria a adoção de medidas preventivas capazes de minimizarem o alto grau de infortúnios em Alagoas.
Ademais, a área de abrangência da pesquisa restringiu-se à documentação arquivada no IML Estácio de Lima, que de acordo com a Portaria nº 021/GD/2008 possui área de atuação nos municípios localizados na Região Metropolitana, na Zona da Mata e no Litoral Norte, competindo ao IML de Arapiraca atender aos demais municípios alagoanos, “com a finalidade de disciplinar e ordenar os serviços de recolhimento de cadáveres e realização de exames de corpo de delito” (24).
5. CONCLUSÃO
Os achados no estudo de 1.917 laudos cadavéricos do IML Estácio de Lima, correspondentes ao período de 2011 a 2015, possuem similaridade em comparação a pesquisas do gênero, podendo traçar o seguinte perfil epidemiológico dos acidentes fatais de trânsito de Alagoas: as vítimas mais comuns correspondem a homens, em idade entre 20 e 39 anos, solteiros, pardos e sem nível superior declarado, mediante colisão, no período noturno (18h01min- 00h00min), e nos fins de semana. São recorrentes acidentes fatais com motocicletas, por politraumatismo, em vias públicas municipais.
Apesar de resultados equivalentes com estudos realizados no Brasil, o não preenchimento conclusivo de campos nas fichas cadavéricas reduziu o grau de comparabilidade com o acervo literário adotado na pesquisa frente às variáveis analisadas, sinalizando a necessidade de aperfeiçoamento na atividade de coleta dos dados periciais, a partir da capacitação dos agentes públicos para descrição clara, concisa e coerente dos laudos dos acidentes de trânsito.
A catalogação manual dos acidentes inviabiliza o gerenciamento das causas e efeitos dos acidentes de trânsito em Alagoas, razão pela qual a implantação de sistema informatizado garantiria a percepção tempestiva da dinâmica dos infortúnios. A redução dos riscos, pelas entidades federativas, pode ser efetivamente implementada, com ações continuadas de melhorias no manto asfáltico das rodovias e nas sinalizações horizontal e vertical, e exigência de educação para o trânsito, de modo transversal, em todos os níveis e modalidades de ensino.
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