Os autores informam não haver conflito de interesse.
SOCIAL SECURITY BENEFITS DUE TO DEPRESSIVE EPISODE IN BRAZIL (2008-2019)
Nilton da Silva Oliveira Junior (1)
http://lattes.cnpq.br/3072917766111216 – https://orcid.org/0000-0001-8457-771X
João Silvestre Silva-Junior (2)
http://lattes.cnpq.br/8530016527502011 – https://orcid.org/0000-0001-7541-5946
Ivan Dieb Miziara (3)
http://lattes.cnpq.br/3120760745952876 – https://orcid.org/0000-0001-7180-8873
(1) Programa de Residência Médica em Medicina do Trabalho, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil (autor principal).
(2) Departamento de Medicina Legal, Bioética, Medicina do Trabalho e Medicina Física e Reabilitação, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil (orientador).
(3) Departamento de Medicina Legal, Bioética, Medicina do Trabalho e Medicina Física e Reabilitação, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil (autor secundário).
Email: nilton.sojunior@fm.usp.br
RESUMO
Introdução: Os transtornos mentais e comportamentais corresponderam à terceira principal causa de concessão de benefícios por incapacidade laborativa pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com destaque para o Episódio Depressivo Maior (EDM). Objetivos: Apresentar a frequência de concessão de benefícios previdenciários por incapacidade em decorrência de EDM no Brasil. Material e método: Estudo ecológico da base de dados públicos do INSS quanto aos auxílios por incapacidade laborativa concedidos entre 2008 e 2019. Resultados e discussão: A média de benefícios concedidos por EDM foi de 56.643 (desvio padrão – dp 6.201). A média masculina foi 16.837 (dp 2.227), ou 29,67% (dp 1,13) e a feminina, 39.806 (dp 4.106), ou 70,33% (dp 1,13). Na área urbana a média foi 55.044 (dp 5.982), ou 97,18% (dp 0,27) e, na rural, 1.599 (dp 267), ou 2,82% (dp 0,27). Conclusão: Os benefícios por EDM incapacitante foram concedidos principalmente para mulheres de regiões urbanas e sem relação com o trabalho. Os dados justificam a necessidade de medidas efetivas para mitigar o impacto desses afastamentos nos trabalhadores e reabilitá-los para reinserção no mercado de trabalho.
Palavras-chaves: Transtorno Depressivo, Saúde do Trabalhador, Previdência Social, Afastamento por motivo de saúde.
ABSTRACT
Introduction: Mental and behavioral disorders corresponded to the third main cause of disability benefits granted by the National Institute of Social Security (INSS), especially the Major Depressive Episode (MDE). Objectives: Present the frequency of granting social security benefits for disability due to MDE in Brazil. Material and method: Ecological study of the INSS public database regarding work disability benefits granted between 2008 and 2019. Results and discussion: The average number of benefits granted by MDE was 56,643 (standard deviation – sd 6,201). The male mean was 16,837 (SD 2,227), or 29.67% (SD 1.13) and the female mean was 39,806 (SD 4,106), or 70.33% (SD 1.13). In the urban area, the average was 55,044 (SD 5,982), or 97.18% (SD 0.27) and, in the rural area, 1,599 (SD 267), or 2.82% (SD 0.27). Conclusion: Disabling MDE benefits were granted mainly to women from urban and non-work related regions. The data justify the need for effective measures to mitigate the impact of these leaves on workers and rehabilitate them for reintegration into the labor market.
Keywords: Depressive Disorder, Occupational Health, Social Security, Sick Leave.
1. INTRODUÇÃO
Os transtornos mentais e comportamentais corresponderam à terceira principal causa do benefício auxílio por incapacidade laborativa temporária concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) nas últimas duas décadas (1). Destaca-se o Transtorno Depressivo Maior (TDM) (2, 3), que consiste tipicamente em um transtorno de humor, multifatorial, com dimensões psicológicas, biológicas, genéticas e ambientais e que podem estar relacionados à diminuição da serotonina. (4). Tais quadros acometem cerca de 4,5% da população mundial, sendo 3,8% da população das Américas (5). A incidência de casos é de duas mulheres para cada homem, entre os 20 e 40 anos (6).
A TDM pode se apresentar como um Episódio Depressivo Maior (EDM), que consiste principalmente em um quadro com humor deprimido, diminuição do prazer, variação significativa de peso, alterações do sono, fadiga, sentimentos de inutilidade pensamentos recorrentes de morte e ideação suicida (2, 3).
Considerando o impacto desse transtorno mental para as atividades de vida diária, inclusive quanto à prática laboral, este estudo objetiva apresentar a frequência de concessão de benefícios previdenciários do tipo auxílio por incapacidade decorrentes de EDM no Brasil, no período entre os anos de 2008 e 2019.
2. MATERIAL E MÉTODO
Trata-se de um estudo ecológico a partir da base de dados públicos divulgados pelo INSS na plataforma “Infologo AEPS” (7) quanto aos benefícios concedidos conforme os seguintes critérios: grupo CID referente a “transtornos mentais e comportamentais”; e grupo principais espécies referente a “auxílio-doença” e “auxílio-doença acidentário”. O primeiro indica um benefício cuja doença ou agravo não tem relação com exposições de risco nos ambientes e condições de trabalho, ou seja, de espécie previdenciário (B31); os benefícios de espécie acidentária (B91) são caracterizados pela perícia médica quando há o reconhecimento de nexo técnico previdenciário por acidente de trabalho, acidente de trajeto, doença do trabalho ou doença profissional (8).
Da planilha resultante, foi selecionada a linha com o código CID-10 F32 – Episódios Depressivos. Os resultados foram analisados conforme sexo (masculino/feminino), clientela (rural/urbano) e espécie (previdenciário/acidentário). Os valores serão mostrados de maneira absoluta e relativa, ao longo do período selecionado.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No período em análise foram concedidos 2.454.805 benefícios por incapacidade decorrentes de transtornos mentais e comportamentais, com uma média anual de 204.567 (desvio padrão – dp 17.107). A média de benefícios concedidos por EDM entre os anos de 2008 e 2019 foi de 56.643 (dp 6.201), o que representa uma média de 27,69% (dp 2,04) do total de benefícios concedidos por transtornos mentais no período.
O ano de 2008 apresentou o maior número de benefícios concedidos em números absolutos (67.473), enquanto o ano de 2015, apresentou o menor (45.366). Em valores relativos, o ano que apresentou maior número foi 2008 (32,02%) e o ano que apresentou o menor foi 2017 (25,51%) (Tabela 1).
Cabe ao perito médico do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) analisar a plausibilidade das relações entre ambiente/condições de trabalho como causa, ou concausa, de adoecimento incapacitante (8). A média de benefícios da espécie previdenciária foi 53.271 (dp 5.425), que corresponde a uma média de 94,13% (dp 1,22), e a da espécie acidentária foi 3.372 (dp 978), ou 5,87% (dp 1,22). O ano de 2009 foi aquele com maior número de benefícios relacionados ao trabalho (8,26%), enquanto o ano de 2018 teve o maior número de benefícios do tipo auxílio-doença previdenciário (B31) (95,50%).
Uma hipótese para esta diferença é que as ferramentas de análise da Previdência Social não levam em consideração a presença de fatores psicossociais no trabalho para conferir o nexo técnico entre doença e trabalho. Provavelmente, trabalhadores que sofreram exposição ocupacional a tais estressores não tiveram o seu benefício caracterizado como acidentário por dificuldades da perícia médica em reconhecer que os aspectos psicossociais podem contribuir para o adoecimento incapacitante (9).
Cumpre consignar que o perito médico pode exercer sua autonomia decisória e negar a caracterização acidentária do requerimento (10). Em trabalho publicado por Silva-Junior e colaboradores (10), é discutido que a principal justificativa descrita pelos peritos médicos previdenciários para descaracterizar o nexo técnico epidemiológico previdenciário (NTEP) indicado pela lei previdenciária foi que o segurado periciado relatava que a lesão não ocorreu no trabalho.
Com relação ao sexo, a média de benefícios, concedidos por TDM para o sexo masculino foi 16.837 (dp 2.227), o que representa uma média de 29,67% (dp 1,13) e para o sexo feminino foi 39.806 (dp 4.106), ou 70,33% (dp 1,13). O ano de 2008 foi aquele na qual houve o maior número de benefícios concedidos ao sexo masculino (31,56%) e o ano de 2014, ao feminino (72,12%). Era esperada essa maior prevalência de acometimento do sexo feminino (6). Este resultado é similar a outros estudos que discutem a maior frequência de concessão para mulheres (9). Há associação aos determinantes sociais e culturais em que as mulheres estão inseridas, sendo estas submetidas a diversos papéis na sociedade, favorecendo o aparecimento de sintomas como estresse, ansiedade, depressão, dentre outros. Além disso, as flutuações hormonais que elas possuem, também favorecem o aparecimento de sinais e sintomas que se configuram como esgotamento mental (11).
Para as clientelas, a média de benefícios concedidos por TDM na área urbana foi 55.044 (dp 5.982) e 1.599 (dp 267) para trabalhadores rurais, o que representa, respectivamente, 97,18% e 2,82% do total (dp 0,27). Em 2010 houve um maior número de benefícios concedidos na área rural (3,31%) e em 2019, na urbana (97,61%). Bezerra (12) descreve que o acesso de homens em área urbana com Transtornos Mentais Comuns (TMC) ocorre com maior frequência em serviços particulares, enquanto em área rural o acesso se faz majoritariamente pela atenção básica, com agravantes de distância, barreiras geográficas e pouca oferta de transporte, sendo de elevado custo para a população rural. Esta enfrenta dificuldades de acesso aos serviços de saúde e dependência da atenção primária à saúde como única alternativa de assistência à saúde. Isto pode justificar a discrepância entre os números de benefícios concedidos entre áreas urbana e rural.
4. CONCLUSÃO
Os dados demonstram que no período de 2008 a 2019 os benefícios por TDM foram concedidos principalmente para mulheres de regiões urbanas, cujos quadros não foram reconhecidos como relacionados ao trabalho. O panorama apresentado neste estudo indica a necessidade de apontar medidas efetivas para promover a saúde mental de trabalhadores mais suscetíveis aos quadros de TDM, assim como intervenções terciárias voltadas a mitigar seus impactos na capacidade laborativa aumentando a chance da reintegração produtiva no trabalho.
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