Os autores informam que não há conflito de interesse.
Maria Cecília Hessel Lopes
Renata Yumi Lima Konichi
Duarte Nuno Vieira
INTRODUÇÃO/FUNDAMENTOS: O Dano Estético Temporário (DET) corresponde ao período em que a vítima, devido a evolução do tratamento/cura das lesões, teve sua aparência prejudicada de maneira significativa, o que pode implicar em constrangimento na sua vida familiar, social, sexual e profissional. Esse conceito de dano foi introduzido inicialmente na França, na nomenclatura Dintilhac que o descreve e delimita seus contornos. Ela entende que o dano estético temporário é frequente e real e, por isso, deve ser definido separadamente: “Alteração da aparência física da vítima, certamente temporária, mas com consequências pessoais muito prejudiciais relacionadas à necessidade de se apresentar para terceiros em um estado físico alterado”.
A dificuldade do médico perito em avaliar as sequelas do dano estético temporário (DET), está na caracterização desse tipo de dano, uma vez que não deixou cicatriz ou incapacidade funcional permanentes ou duradouras, uma vez que se manifesta apenas no período entre a lesão e sua consolidação/tratamento, ou seja, anteriormente à perícia. Essa qualidade de dano, majoritariamente, é subestimada não sendo considerada no momento da avaliação pericial, apesar do intenso sofrimento psíquico que provoca. À despeito da realidade brasileira, este tema já é discutido e reconhecido em outros países.
OBJETIVOS: Abordar o dano estético temporário e o debate sobre a sua caracterização e valoração como um dano à parte do quantum doloris. Esse tipo de dano, na maioria dos casos, é subestimado e não é considerado no momento da avaliação.
MÉTODOS: Foi realizada uma revisão bibliográfica com todos os artigos open access encontrados no período compreendido entre os anos de 1999 a 2022, nas línguas portuguesa, espanhola, inglesa e francesa. Foram usados os descritores: “dano estético”, “dano estético temporário”, “medicina legal”, “responsabilidade civil” e “reparação”. Plataformas: Google Acadêmico, Scielo, LILACS e PubMed.
REVISÃO DE LITERATURA: Num mundo onde a aparência exterior é superestimada e os testemunhos publicitários são os termos de comparação, o dano estético, ainda que temporário, adquire inevitavelmente um valor nunca visto. Tendo em conta que a aparência pode ser considerada um patrimônio importante, quando prejudicada, ainda que temporariamente, a vítima merece compensação.
O DET está representado na Carta Magma, no seu artigo 1º, parágrafo III (sobre a dignidade humana); e em seu artigo 5º, parágrafo X (a inviolabilidade da imagem). Bem como nos artigos 186 – em relação a causar dano – e 927, na obrigação do reparo do dano independente da culpa (Teoria da Responsabilidade Objetiva), do Código Civil Brasileiro.
A avaliação do dano estético temporário (DET) poderá ser incluída na avaliação do quantum doloris. Porém, quando a presença da lesão, no período entre o trauma e a sua consolidação ou cura, comprometa a estética de forma tão significativa, causando sofrimento intenso, que lhe traga grande constrangimento e isolamento social, ela se faz merecedora de ser descrita como um dano à parte dos danos morais. Indivíduos que sofrem queimaduras que acometem grande extensão do seu corpo, incluindo a face, são exemplos pertinentes. Nessas situações, a vítima – devido a lesões iniciais -, durante o processo de cicatrização e cuidados envolvidos (enxertos, expansores de pele, roupas e máscaras, órteses) tem uma alteração evolutiva na aparência física, que impacta diretamente nas suas funções habituais, pelo período até a cura ou consolidação da lesão.
A avaliação do dano estético temporário diz respeito a um exacerbado sofrimento da vítima, em relação a sua aparência, durante o tratamento. Ocorre em casos pontuais, nos quais a alteração estética antes da consolidação da lesão causa sofrimento e isolamento social tão intensos que merece ser particularizado.
CONCLUSÕES: A apreciação do DET, de maneira isolada, é necessária para que a vítima possa obter a devida reparação. Sua avaliação pode incluir o sofrimento psíquico da vítima e a sua valoração pode ser expressa por meio da Escala de Sete Graus ou pelo Método AIPE, como no dano estético permanente. Entretanto, cabe salientar que sua caracterização e a atribuição de sua valoração, necessitam de adequada fundamentação.
O dano estético temporário não é um tema considerado no Brasil. A qualidade temporária do dano é reconhecida nos casos de lesão funcional e incapacidade, mas no âmbito estético ainda não é discutida.
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