O artigo busca realizar análise de processos judiciais cíveis versando sobre supostos erros médicos durante o período neonatal e determinar as principais causas de litígio, perfil dos réus e autores, relevância do laudo pericial para as decisões judiciais proferidas e as sanções judiciais que foram aplicadas.

Resumos

ANÁLISE DE PROCESSOS JUDICIAIS CÍVEIS NO ALEGADO ERRO MÉDICO DURANTE O PERÍODO NEONATAL NO ESTADO DE SÃO PAULO EM 2021

Virginia Maria de Souza Caselato (1)

Jaqueline de Almeida Silva (2)

Daniele Muñoz (3)

Eduardo Costa Sá (4)

(1) Médica pós-graduanda do Curso de Espacialização em Medicina Legal e Perícia Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

(2) Médica pós-graduanda do Curso de Espacialização em Medicina Legal e Perícia Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

(3) Professora do Curso de Espacialização em Medicina Legal e Perícia Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

(4) Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina.

INTRODUÇÃO: O período neonatal é compreendido como o período de vida que ocorre a partir do nascimento até 28 dias de vida. O Estado de São Paulo corresponde a 20% dos nascidos vivos no Brasil e, somente no ano de 2021, ocorreram 526.339, nascimentos no estado (1). A judicialização da medicina consiste na disputa, em juízo, das conexões entre as partes afeitas na assistência em saúde como médicos, pacientes e instituições. Atualmente, verifica-se uma crescente judicialização da medicina, resultando em um número cada vez maior de processos questionando condutas médicas que permeiam o período neonatal (2), com grande destaque e repercussão na mídia acerca da responsabilidade profissional dos agentes e instituições de saúde envolvidas (3). Como consequência direta de tais fatos, a especialidade de medicina legal e perícia médica apresenta grande relevância para o esclarecimento e resolução destes conflitos, sendo instrumento de auxílio para formação da convicção do juízo.

OBJETIVOS: Realizar análise de processos judiciais cíveis versando sobre supostos erros médicos durante o período neonatal e determinar as principais causas de litígio, perfil dos réus e autores, relevância do laudo pericial para as decisões judiciais proferidas e as sanções judiciais que foram aplicadas.

METODOLOGIA: Foi utilizada a ferramenta de busca “consultas de jurisprudência” do Tribunal de Justiça de São Paulo, efetuou-se a pesquisa de acórdãos das classes “apelação cível” e “remessa necessária” que continham as palavras-chave “erro médico” e “recem nascido” julgados no ano de 2021. Foram encontrados 216 resultados para a busca, os quais foram individualmente analisados e, em seguida, filtrados com a exclusão de 105 acórdãos por não corresponderem ao período neonatal, além de outros 9 acórdãos excluídos por terem anulado a sentença e determinado a realização de nova perícia, resultando em 102 casos elegíveis ao estudo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO: Quanto ao polo passivo, figuraram na condição de Réus o nosocômio em 76,47% dos casos, os Municípios em 19,61%, o convênio / seguro em 17,65%, o médico em 15,69% e o Estado de São Paulo em 14,71% dos casos, sendo que em 43,14% dos casos houve a formação de litisconsórcio passivo com mais de um Réu. Merece destaque, ainda, a constatação de que em nenhum dos casos o médico respondeu sozinho ao processo.
Quanto à administração dos nosocômios, 52,94% se tratavam de serviços públicos e 47,06% de instituições particulares / privadas.
Os recém-nascidos a termo corresponderam a 70,59% dos casos, e o óbito neonatal foi o desfecho em 40,2% do total de casos analisados. Levando em consideração apenas os casos que resultaram em óbito, 56,1% eram nascidos a termo.
Quanto às perícias médicas, estas foram realizadas em 94,12% dos casos e a decisão judicial concluiu de acordo com a perícia em 90,20% dos casos. Em 51,96% do total foi considerado a favor do requerente.
Entre os casos que receberam indenização, 25% versavam sobre desdobramentos de asfixia perinatal exclusivamente, 7,1% asfixia perinatal associada à síndrome de aspiração de mecônio, 3,5% asfixia perinatal associada à tocotrauma, 10,7% dos casos à tocotrauma exclusivamente e 7,1% à síndrome de aspiração de mecônio. Os demais casos apresentaram outros motivos de falha de prestação de serviço, muitas vezes referente à alta hospitalar com agravamentos posteriores.
Por fim, quanto ao valor das indenizações globais, foi observada uma média geral de R$147.633,96, com o mínimo de R$3.000,00 e o máximo de R$500.000,00. Os maiores valores observados foram em casos de sobrevivência com sequelas, cuja indenização foi acompanhada de condenação ao pagamento de pensão. Em geral, verifica-se que as indenizações, nos casos de óbito, especificamente, foram estabelecidas em uma média de R$100.000,00, aproximadamente, para cada genitor.


Referências bibliográficas

1- Ministério da Saúde (BR). Painel de Monitoramento de Nascidos Vivos – Plataforma Integrada de Vigilância em Saúde [Internet] [acessado em 21 de julho de 2023]. Disponível em: http://plataforma.saude.gov.br/natalidade/nascidos-vivos/

2- Sens MM, Stamm AMN de F. A percepção dos médicos sobre as dimensões da violência obstétrica e/ou institucional. Interface [Internet]. 2019 [citada em 20 de junho de 2023];23. Disponível em: https://doi.org/10.1590/Interface.170915

3- Chaves O, Zerbini T. Judicialização da medicina e o impacto orçamentário na administração pública: uma abordagem Médico-Legal. Saúde ética justiça [Internet]. 12 de dezembro de 2017 [citado em 4 de julho de 2023];22(2):58-65. Disponível em: https:// doi.org/10.11606/issn.2317-2770.v22i2p58-65